Há alguns anos, uma mãe trouxe sua filha adolescente para ver o Prof David Zangen, Diretor de Endocrinologia Pediátrica no Hadassah Medical Center. A menina ainda não havia atingido a puberdade, e mãe e filha estavam preocupadas. Quando Zangen examinou a menina, ele viu que realmente não havia desenvolvimento dos seios ou qualquer outro sinal de puberdade e, em estudos de imagem, não foram detectados ovários.

Passados alguns anos a irmã da garota procura o Prof Zangen. Ela também não havia alcançado a puberdade, e ela também não tinha ovários. O Prof Zangen sabia que havia se deparado com um fenômeno que gritava por investigação genética.

Entre 5 e 10 por cento dos adolescentes não alcança a puberdade quando esperado. Em geral ocorre apenas um atraso. E ela chega alguns anos depois – talvez aos 15 em vez de aos 12. Estas crianças estão fisicamente bem. Em casos raros (mas muito importantes de se detectar), esse problema é causado por uma disfunção na glândula pituitária que interfere na produção de hormônios, necessária para a entrada na puberdade. Essa disfunção pode ser causada por uma lesão que ocupa espaço (como um aneurisma ou um tumor) ou por um defeito genético. Mas este não era o caso das duas irmãs, uma vez que exames de imagem revelaram que ambas não tinham ovários. Seria uma mutação genética a responsável?

Através do sequenciamento completo de genes, o Prof. Zangen e sua equipe colaborativa, incluindo o Prof Levy-Lahad do Jerusalem’s Shaare Zedek Medical Center e o Dr Offer Gerlitz da Hadassah-Hebrew University School of Medicine, descobriram que as duas irmãs tinham a mesma mutação do gene BRCA2. Muitos de nós conhecemos a mutação no gene BRCA como a culpada em cânceres de ovário e mama. Mas não era sabido, antes da descoberta do Prof Zangen que o BRCA2 estava relacionado ao desenvolvimento saudável dos ovários – uma descoberta que rendeu aos pesquisadores um cobiçado lugar na 13ª edição de setembro da The New England Journal of Medicine.

The Link:  https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1800024

Mas qual exatamente era a conexão? Qual é a função de um gene BRCA2 saudável? O Prof Zangen e sua equipe sabiam que o BRCA2 tem um papel crucial no reparo de DNA. Através das nossas vidas, as células do nosso corpo passam pela divisão celular. Quando tudo dá certo durante esse processo, o DNA é copiado com exatidão. Mas quando algo dá errado, o corpo precisa encontrar os erros e corrigi-los. “Erros não corrigidos podem levar a um câncer ou outros desastres,” explica o Prof Zangen. E assim foi para as duas irmãs. Como a correção falhou, elas não desenvolveram ovários!

Como relata o Prof Zangen, se os erros seguirem seus próprios mecanismos sem nenhuma interferência, as células podem se dividir de maneira descontrolada como acontece com o câncer, ou não se dividirem propriamente em um espermatozoide ou um óvulo, causando infertilidade. Desta maneira, se as correções não ocorrerem da maneira necessária, uma garota pode não desenvolver ovários ou pode produzir apenas um número limitado de óvulos, o que pode resultar em uma menopausa prematura, em idades abaixo dos 35-40 anos, ou até mesmo aos 20. Ela pode também ter maior risco de desenvolver câncer nos ovários.

No caso das duas irmãs, os investigadores conseguiram descobrir que o problema era a falta de reparo do DNA fazendo uma biópsia e expondo o tecido a radiação. Ao fazê-lo, eles descobriram que o DNA quebrava e não era corrigido.

Por causa da descoberta da mutação do BRCA2 nas irmãs, o Prof Zangen analisou a mãe em busca da mesma mutação. Ele descobriu que ela realmente carregava a mutação do BRCA2. Com uma nova análise, desta vez incluindo exames de imagem, ele descobriu que a mãe tinha câncer nos ovários. “O câncer dela foi diagnosticado em um estágio muito mais inicial do que teria sido se não tivéssemos descoberto as mutações do BRCA2 nas suas filhas”, aponta o Prof Zangen. Suas filhas serão acompanhadas de perto por causa do risco de câncer de mama e de “ovário remanescente”.

Se adolescentes não atingirem a puberdade e for descoberto que não tem ovários, elas devem definitivamente ser analisadas por mutações em genes de reparo ao DNA como o BRCA2, diz o Prof Zangen. Este é certamente o protocolo do Hadassah agora, e ele acredita que deve ser o protocolo no mundo todo.

Neste momento a ciência médica é incapaz de interferir na capacidade do reparo de DNA de acionar o desenvolvimento de ovários. Uma terapia de substituição hormonal, no entanto, conseguiu  fazer com que as meninas atingissem a puberdade e tivessem ciclos menstruais regulares, mas não fertilidade. O Prof Zangen está esperançoso de que, no futuro, haja uma maneira de intervir no reparo de DNA e melhorar esta perigosa disfunção.