Uma epidemia de ataques veiculares intencionais (intentional vehicular assaults – IVA) direcionados a pedestres levou especialistas em traumatologia do Hadassah Medical Center a analizar os padrões específicos de ferimentos que estes causam.

“Nós admitimos a hipótese de que IVAs estão associados com um padrão e uma severidade específicas de ferimentos”, explica o dr Miklosh Bala, chefe da Hadassah Trauma Unit. A descoberta da equipe de pesquisa foi que, realmente, “a severidade e padrão de ferimentos resultantes de um IVA é significativamente diferente de um trauma não-intencional de pedestre (PT).” Eles descobriram que IVAs resultam em mais mortes e traumatismos cranianos severos que acidentes não intencionais. Além disso, eles reportam que a maior frequência de ferimentos às extremidades inferiores durante um IVA, quando comparado a um PT, “dá mais suporte à nossa suposição de que IVA causa um padrão diferente de ferimentos”.

Os pesquisadores explicam que estudando filmagens e relatos de testemunhas, eles supõem que “a aceleração deliberada do veículo contra um pedestre ereto pode levar a um trauma de alta energia nas extremidades inferiores e a um traumatismo craniano severo quando a vítima é arremessada em direção ao veículo.”

Os dados derivam dos 29 IVAs que aconteceram em Israel entre Fevereiro de 2008 e Maio de 2016, nos quais houve vítimas. Civis foram visados em 15 destes ataques (52%), e membros das forças de segurança, incluindo policiais, guardas da fronteira e soldados em 14 dos ataques (48%). Veículos usados para executar os ataques incluem 18 veículos privados (62%), 5 veículos mecânicos pesados (17%), 4 veículos comerciais (14%) e 2 caminhões (7%). Os IVAs mais frequentes aconteceram em ruas de grandes cidades, em bloqueios nas estradas e em estações de trem e ônibus.

Os resultados dos estudos revelaram que entre aqueles feridos por IVAs, 77% sofreram ferimentos nas extremidades inferiores; 58%, ferimentos na cabeça; e 54%, ferimentos faciais. Em contraste, aqueles atingidos por PT tiveram menos ferimentos destes tipos – 54%, 35% e 28%, respectivamente.

O Dr Bala nota que IVAs emergiram recentemente como o método preferido de ataque por indivíduos desarmados e sem treinamento, frequentemente chamados de “lobos solitários”. Enquanto ele reporta que, até esta data, estes ataques têm ocorrido majoritariamente no Oriente Médio e na Europa, “podemos esperar ataques similares em uma escala mundial, uma vez que muito pouco treinamento ou preparação são necessários para executar um IVA.”

O estudo, intitulado “ When A Vehicle Becomes a Weapon: Intentional Vehicular Assaults in Israel”, co-escrito pelo Dr Bala, Dr Gidon Almogy e Dr Asaf Kedar, está em destaque no The Scandinavian Journal of Trauma, Resuscitation and Emergency Medicine.

“Sejam desastres naturais, acidentes de transporte ou ataques terroristas”, enfatiza o Dr Bala, “o problema permanece o mesmo – isto é, um número de vítimas que sobrecarrega o sistema de saúde local em um período muito curto de tempo”.

Às vezes, você acaba com um incidente com vítimas em massa.

Embora o conhecimento de como lidar com incidentes com vítimas em massa (mass casualty incidents – MCI) seja de imensa importância hoje mais do que nunca, e sua importância é muito bem entendida, ainda existem, diz o Dr Bala, “algumas instituições ao redor do mundo que não estão bem preparadas”. Ele explica que enquanto cursos preparatórios são oferecidos por várias instituições como a FEMA (a Federal Emergency Management Agency) e a EMS (Emergency Medical Services), assim como outras instituições médicas ao redor do mundo, muitos destes cursos não estão facilmente disponíveis para cirurgiões internacionalmente. O Dr Bala reporta que uma pesquisa com cirurgiões ao redor do mundo, conduzida pela World Society of Emergency Surgery (WSES), revelou que apenas 28,3% haviam participado de cursos de MCI fora de suas instalações médicas, enquanto 84,3% expressaram grande interesse em participar de um.

Para atender a essa necessidade, a WSES e a Israeli Trauma Society (ITS) estabeleceram uma plataforma educacional para compartilhar informação sobre a preparação e gerenciamento de MCIs. O Dr Bala e colegas do Hadassah, junto com membros do ITS Committee on Trauma, desenvolveram um curso básico de gerenciamento de MCI. A WSES incluiu este curso no currículo na sua pós-graduação para cirurgiões em nível mundial.

Através do seu envolvimento em tamanha empreitada, a WSES pode oferecer visitas locais para avaliar as necessidades e configurações locais em uma instituição médica específica, assim como conduzir treinamentos de MCI, junto com autoridades locais.

O Dr Bala nota que assim como especialistas israelenses em lidar com atentados suicidas se prontificaram a ensinar seus colegas na Europa e América do Sul a como se preparar para tal violência, eles agora se dispõe novamente a ajudar seus colegas a se prepararem para MCIs.

Os objetivos do curso são familiarizar os participantes com a definição de MCI e a terminologia básica relacionada a estes eventos, descrever os padrões mais comuns de ferimentos, prover informações essenciais para gerenciamento médico e logístico apropriados a MCI, e oferecer ferramentas para estabelecer campanhas de preparação. O curso responde perguntas como: Qual é a função do oficial de triagem? Quais são os princípios da triagem? Qual é o protocolo de ativação correto para uma MCI? Como se lida com a família de uma vítima? Como priorizar pacientes? Como se trata um padrão de ferimentos multidimensional? Quais são os problemas éticos envolvidos? Como se faz um debriefing, uma auto avaliação, após uma MCI para se chegar mais próximo à perfeição na próxima ocorrência?

O Dr Bala escreveu um capítulo intitulado “Educação e Prontidão para MCI”, para um livro que ainda será lançado, onde ele reavalia os caminhos educacionais hoje existentes para preparar o sistema de saúde para lidar com MCIs. Ele elabora a importância de se realizar diferentes tipos de treinamentos para se preparar para uma MCI antes e organizar sessões de debriefing depois. O Dr Bala enfatiza: “Quando uma instituição médica está pronta com um sistema para MCI, vidas são salvas.”