Nesta epoca do ano, ao celebrarmos as festividades judaicas, há uma sensação de renovação.
Uma das coisas que me ajudou a capturar esse sentimento de renovação em meu trabalho como medica-palhaça no Hadassah Medical Center foi lembrar da visita especial dos refugiados Yazidi. Eles são caras corajosos com um enorme coração.
Os Yazidis chegaram ao Hadassah há dois meses. Eles eram a equipe médica de um campo de refugiados no norte do Iraque e vieram treinar como médicos-palhaços. Eles queriam aprender como implementar o programa de médico-palhaço nas suas clinicas e hospitais locais e treinar mais palhaços quando voltassem para casa.
Era um lembrete para mim para colocar coisas em perspectiva, para ser agradecida por todo o bem que temos, e para abrir nossos corações mais e mais. Não é garantido que pessoas angustiadas estarão dispostas a dar de si mesmas para outras pessoas. Mas se doar é uma benção empoderadora – algo que me leva à nossa historia hoje.
A palhaça-médica Shiri Breuer ajudou uma criança doente e hospitalizada, que estava angustiada, a dar de si mesma dividindo com ela algo que a jovem garota tinha para dar. Sempre há algo que pode ser dado e dividido.
Shiri conta a história: “Eu estava andando pela ala de oncologia quando fui atraída pelo som de um choro. Era o choro de uma garota relativamente mais velha – um choro alto, prolongado. Eu caminhei pelos corredores seguindo o som, imaginando de onde ele estaria vindo.
No final da ala, havia uma sala de tratamento de isolamento. No final da sala, uma grande porta de vidro, fechada. Do outro lado da porta, estavam sentados o pai, uma enfermeira e uma garota de uns 12 anos, que estava tendo seu sangue colhido para um exame.
A garota estava chorando com os olhos fechados. O pai estava concentrado nela, chamando seu nome. A enfermeira estava bastante ocupada. Eles não me viram, mas eu os vi.
Em algum lugar atrás deles, através da porta trancada, eu comecei meu truque de mágica com um ponto de luz. O pai da menina foi o primeiro a me ver, e respondeu com entusiasmo. Ele tentou fazer com que a filha se interessasse, mas ela continuou a chorar com os olhos fechados. Em certo ponto, eu comi a luz. Ele ficou atônito e pediu uma explicação. “Isso é remédio”, eu lhe disse. Ele pediu um pouco. Eu joguei o remédio imaginário através da porta de vidro e ele o agarrou! O choro parou, e os olhos da garota se abriram.
Nós continuamos a brincar com a luz, e a filha pediu para provar a droga maravilhosa que estava passando através do vidro. O exame havia terminado, e a enfermeira saiu com um sorriso, mas apenas após, obviamente, provar do remédio imaginário também.
De repente, em um momento, a risada desapareceu, e a filha se entristeceu. O pai perguntou “O que aconteceu, querida? Por que você está brava?”
A garota não respondeu, segurando a raiva. O pai tentava consolar a menina, mas isso não ajudou. Ela simplesmente se fechou e fechou os olhos. Ele se entristeceu e começou a abotoar o suéter dela. Ela ficou sentada como uma estátua, com os olhos fechados. Os movimentos dele eram pesados. Foi um momento tocante. O pai estava cheio de preocupação e amor por sua filha. Eu olhei para aquele momento e me lembrei do quanto é difícil ser humano, e quanto poder um coração que ama tem.
Enquanto eu observava, não pude ignorar os botões especiais no suéter da menina. Eles eram decorados com dourados e brilhos. Eu bati na porta e perguntei aonde ela havia conseguido tanto ouro e diamantes. Ela abriu os olhos. A pergunta a havia alcançado. Eu continuei a encara-la, e ela sorriu. Havia uma porta entre nós, e eu tentei roubar os diamantes dela como uma ladra.
Ela ria, mantendo seus botões de ouro e diamantes para si com grande prazer. Conforme a brincadeira progredia, eu notei a conexão entre a raiva que ela guardava para si e o ouro que ela agora protegia, e tive a sensação de que estávamos no caminho certo. Então, eu parei de tentar roubar (estava ficando exaustivo) e apelei ao seu coração. Lentamente eu comecei a implorar pelas suas joias. Ela olhou para mim com um enorme sorriso, e representou a pantomima de retirar ouro e diamantes de suas roupas e imaginariamente jogá-los através da porta – como havíamos jogado o remédio imaginário.
Eu aceitei o presente agradecida e o coloquei em meu bolso. Eu senti que ela havia me dado algo precioso. Nos despedimos com declarações de amor, de abraços e beijos através da porta de vidro.
Com os votos de um Shaná Tova (bom ano), cheio de dar para nós e para aqueles que nos rodeiam,
com amor, Nechama (Bula Bola) e a equipe de palhaços-médicos do Hadassah